Diálogo Interativo

Espaço para troca de ideias sobre diversos assuntos, com destaque para atualidades, comunicação, política, educação e relações humanas.

30 outubro, 2006

De alma lavada

Não preciso fazer qualquer análise neste momento sobre a vitória do presidente Lula nas eleições de ontem. Toda a imprensa nacional está fazendo isso nesta segunda-feira. Aliás, é o assunto que mais vai pautar a mídia nas próximas semanas.

Hoje, sou só alegria. Longe de achar que o Governo Lula é perfeito, tenho a certeza de que o Brasil fez a melhor escolha. Dentre as forças políticas que almejavam a cadeira de presidente, Lula representa o melhor para o país no momento, pelas razões que já sabemos.

Chamou-me a atenção a disputa nos Estados, principalmente a derrota dos Sarney no Maranhão, caso sui generis neste 2º turno. Por uma esquizofrenia local, Lula e Roseana se apoiaram e a população maranhense disse sim ao presidente (84% dos votos) e não à oligarquia no Maranhão, meio que no mesmo caminho da Bahia, que aplicou uma forte pancada em ACM. Lula perdeu em apenas sete das 27 Unidades da Federação. Terá pelo menos 15 governadores em sua base aliada. E Geraldo Alckmin teve cerca de 2 milhões de votos a menos que no primeiro turno.

Reproduzo abaixo artigo de Gilberto Dimenstein publicado hoje no site da Folha, para completar a análise fria do processo. A verdade é que estou feliz pra dedéu.

Abraços a todos.

Por que Lula venceu

Lula venceu por um simples motivo: conseguiu aliar seu passado de retirante nordestino com os avanços sociais nos quatro anos de seu mandato, gerando uma forte identificação com os eleitores, a maioria deles pobres.

Claro que essa identificação foi estimulada por uma permanente operação de marketing como se estivéssemos sempre em ano eleitoral. É claro também que Lula se beneficiou da herança bendita (inflação baixa, aumento das exportações, maior controle dos gastos) do governo anterior.

Mas os números mostram que, nos últimos quatro anos, os mais pobres tiveram aumento expressivo de renda, devido à combinação do Bolsa Família, da elevação do mínimo, baixa no preço dos alimentos, entre outros fatores. A sensação de melhoria não foi uma ilusão, mas real, vista na quantidade de produtos nas geladeiras — e, até, nos migrantes que voltavam para suas terras.

Se isso tudo é sustentável, é outra discussão. O Brasil é um país de maioria de pobres — e os pobres se sentiram menos pobres. Para entender a vitória do Lula, o resto, inclusive o desempenho de Alckmin, não passa de acessório.

26 outubro, 2006

Coração ainda cheio de esperança e fé

Este é meu último texto antes das eleições de domingo. Não tenho muito o que escrever. Os leitores deste blog já conhecem minha posição sobre o que espero que aconteça ao "abrir" das urnas.

Os levantamentos apontam para a reeleição de Lula. Considero pesquisa como fotografia — um retrato de determinado momento sob determinado ângulo. Uma referência, apenas. A referência é favorável, mas só vamos ter o fato em si depois da contagem dos votos. O futuro do país será desenhado por mais de cem milhões de mãos (e corações e mentes) durante as nove horas de duração da votação no dia 29.

Tenho tendências ao parlamentarismo. Embora respeite, admire e faça apologia à história pessoal e política de Lula, que completa 61 anos amanhã, considero que um governo faz menos melecas na proporção inversa ao número de pessoas envolvidas na tomada de decisão. Quanto mais plurais forem os pontos de vista, mais acertadas tendem a ser as decisões e ações de governo. Naquele plebiscito de 1993, furei a decisão partidária e votei no Parlamentarismo. Na época, o PT pregou o Presidencialismo dizendo que os parlamentaristas queriam impedir Lula de governar (todas as pesquisas feitas entre dezembro de 1989 — logo após a vitória de Fernando Collor — e julho de 1994, apontavam Lula como favorito). O Presidencialismo foi mantido mas Lula não foi eleito. A gente não pode ser casuísta, ser favorável a este ou aquele aspecto da política só porque nos favorece num dado momento. Isto vale para reeleição, voto distrital e outros dogmas que serão debatidos sobre a Reforma Política. A reeleição interessou ao PSDB porque FHC estava no poder. Agora não interessa mais ao mesmo PSDB porque Serra e Aécio querem disputar o Planalto e Alckmin pode ser uma pedra em seus sapatos caso ganhe a eleição (cruzes!!!). E assim caminha a Humanidade tupiniquim.

Considero que o governo Lula, mesmo com todos os erros e contradições, foi o que mais acertou. A prioridade às ações de redução da pobreza e da miséria deveriam estar no capítulo 1 de qualquer programa de governo. E, diferentemente de 2002, Lula fez esta campanha com uma extensa folha de serviços prestados aos brasileiros. Não que não tivesse trabalhado pela coletividade desde os tempos de metalúrgico. Mas com o governo na mão, pode-se fazer mais, tem-se mais poder. É isso. Poder fazer mais.

Lá em cima disse que não teria muito o que escrever. Engano. Acabei me entusiasmando. Mas agora fecho estas palavras com o coração leve e com a consciência tranqüila. Seja qual for o resultado, ajudei a campanha de Lula da forma que sei e que pude fazer. Escrevi aqui no Diálogo, repassei textos por e-mail, fui pra rua, distribuí panfletos, participei de reuniões, participei de comício e de bandeiraço, mandei mensagens por celular, usei estrelinha no peito, colei adesivo no carro e na janela do apartamento, conversei com muita gente...

Na política e na História, mudanças só dão resultado depois de um longo, às vezes longuíssimo, prazo. E eu quero estar vivo para saborear pelo menos um pouco desse resultado. As futuras gerações agradecem, até porque o Brasil que sonho para meus filhos tem muitíssima interseção com o Brasil que começou a se desenhar a partir do início de 2003.

"Fé na vida, fé no homem, fé no que virá". Abraços a todos e bom voto.

24 outubro, 2006

Debate dos presidenciáveis deixa tudo como estava

O debate de ontem na Rede Record não teve grandes novidades. Lula e Alckmin apenas reafirmaram tudo que já vem sendo dito na campanha, nos programas de TV, nas entrevistas. Apenas o tom do confronto foi um pouco mais moderado do que o do debate do dia 8 passado, realizado pela Rede Bandeirantes. Aliás, eu fiquei assustado com a metralhadora do candidato do PSDB na Band.

Pelo menos temas dos projetos dos candidatos foram mais abordados no confronto de ontem (pela primeira vez desde 1989, deixei de ver um debate em eleições presidenciais, o do SBT). Os candidatos falaram sobre comércio exterior, educação, infra-estrutura, transportes, saúde, economia, políticas sociais, dentre outros temas.

Acredito que não teremos grandes novidades até domingo. Pode ser que tentem requentar alguma besteira petista para tentar uma virada. Com uma diferença de mais de 20 milhões de votos projetada pelas pesquisas, acho pouco provável que Lula perca a eleição. Não se trata de cantar vitória — para mim, eleição só termina após o cômputo do último voto. Alckmin teria de tirar diretamente de Lula cerca de 10,5 milhões de votos até domingo, cerca de 2,1 milhões por dia. De qualquer forma, vamos esperar.

Passada a ressaca eleitoral e confirmado o segundo mandato de Lula (é o que desejo), o governo se deparará com outros problemas: garantir a governabilidade, a sustentação num Congresso completamente esquizofrênico e ainda enfrentar o tiroteio remanescente das melecas protagonizadas por membros do governo e/ou do PT. Além disso, virão as articulações para as Presidências da Câmara e do Senado e a montagem da nova equipe de governo, sem "aloprados", de preferência.

Considerei equilibrado o resultado do debate da Record, o que é bom para Lula. Que venha o da Globo sexta-feira!

PS: Vou deixar para falar sobre Reforma Política depois de domingo.

02 outubro, 2006

... E o jogo foi pra prorrogação!

Acordei hoje antes das seis da manhã, depois de uma boa noite de sono, que achei que não teria. Dirigi os quarenta e oito quilômetros que separam a casa da minha namorada da minha casa pensando no que escrever hoje sobre as eleições.

Minha meta hoje é escrever apenas sobre as eleições para o Executivo. Pretendo deixar para analisar o Legislativo daqui a alguns dias, já que os votos para deputado demoram um pouco mais para ser inteiramente totalizados e é preciso aguardar as articulações para a presidência da Câmara e do Senado. Pelo menos uma coisa é certa: já que elegeram as maiores bancadas, o PMBD ficará com a presidência da Câmara e o PFL com a do Senado. Já considero isso um retrocesso.

Preciso tentar escrever com isenção e uma certa dose de frieza. Neste momento, análises apaixonadas só tornam o cenário ainda mais nebuloso e tornam as dúvidas ainda mais difíceis de ser esclarecidas. A grande pergunta que fica, para todos que como eu defenderam e defendem a reeleição do presidente Lula, é: o que aconteceu?

Aconteceu uma grande migração de votos para Geraldo Alckmin, sobretudo entre o eleitorado de Heloísa Helena. Grande parte dos potenciais eleitores da senadora achou melhor descarregar seu voto de protesto em quem pode, de fato, chegar à Presidência. Alckmin conseguiu tirar de HH boa parte do voto "do contra".

Aconteceu a consolidação de um racha no PT que já vinha se desenhando há tempos. Dentre as principais candidaturas à Presidência, tivemos Lula, do PT, Heloísa Helena, ex-PT, e Cristovam Buarque, ex-PT. Não vou falar aqui do processo de saída de HH e Cristovam do partido. Daria um outro post.

Aconteceu uma série de coisas inaceitáveis com o governo Lula e com o PT, coisas que sempre abominamos nos mais de 26 anos de história do partido que nasceu da luta operária para se tornar uma referência política mundial. E justamente como referência, jamais poderíamos ter tido gente envolvida ou sequer suspeita de corrupção.

Aconteceu uma omissão inadmissível para um petista: deixar de ir a um debate com seus oponentes.

Aconteceu a rejeição a posturas arrogantes e ao excesso de confiança. E não foi só na eleição presidencial. O povo baiano suspendeu do poder a oligarquia de ACM ao eleger Jaques Wagner no primeiro turno. Surpresa total.

Aconteceu que o povo disse a Lula: "Aprovamos seu governo e seu trabalho como presidente, mas desaprovamos veementemente as atitudes corruptas de parte da sua equipe". O resultado disso está hoje em todos os jornais.

Não tapemos o sol com a peneira. Alckmin é favorito e conta com toda a mídia. E se Lula quiser mesmo continuar presidente, terá que calçar botina e pisar pessoalmente o barro do interior do país. Terá que ter a coragem de escorraçar antigos "companheiros" que ajudaram a destruir a imagem do PT nos últimos anos. Terá que confiar menos na sua assessoria e assumir o comando do resto de governo e da campanha. Terá que pedir cabeças em bandejas. E, principalmente, terá que animar a militância para a campanha de rua.

Para fechar por enquanto, reproduzo abaixo boa análise do jornalista Kennedy Alencar, redigida hoje.

Tendência de curvas é virada de Alckmin

Uma fotografia em série da pesquisas Datafolha desde o início de setembro mais o resultado final do primeiro turno mostram que as curvas de Luiz Inácio Lula da Silva e de Geraldo Alckmin podem se encontrar nos próximos dias, com tendência de virada para o tucano.

Vamos aos números do Datafolha desde os dias 4 e 5 de setembro. Lula tinha então 51% de intenção de voto. Oscilou negativamente para 50% nas duas pesquisas seguintes (feitas em 11 e 12 de setembro e 18 e 19 do mesmo mês). Nos levantamentos dos dias 22 e 27 de setembro, variou novamente para baixo (49%). Na pesquisa realizada nos dias 29 e 30, sexta e sábado passados, Lula caiu para 46%. No domingo, teve 48,6% dos válidos, o que equivale a 44,5% de votos computados nulos e brancos.

Ora, como a margem de erro da pesquisa Datafolha do final de semana era de dois pontos percentuais para mais ou para menos, Lula estaria dentro desse intervalo com os 44,5%. No entanto, não é o que a curva revela. O mais importante é olhar uma série de pesquisas, não apenas um levantamento. Desde o início de setembro, Lula perdeu 6,5 pontos percentuais. Deixou escapar a vitória na primeira fase.

No mesmo período, Alckmin subiu onze pontos. Na pesquisa Datafolha de 4 e 5 de setembro, Alckmin tinha 27% de intenção de voto. Oscilou para 28% no levantamento posterior (dias 11 e 12). Variou positivamente para 29% em 18 e 19 do mês passado. O dossiêgate teve início no dia 15, uma sexta-feira, mas só na semana seguinte começou a derrubar petistas em série e a causar dano político a Lula.

No dia 22 de setembro, Alckmin tinha 31%. Passou a 33% no dia 27. E chegou na véspera da eleição com 35%. Ele teve 41,6% dos votos válidos neste domingo, o que corresponderia a 38,1% na pesquisa que contabiliza todos os votos, não apenas os válidos. O tucano está a apenas 6 pontos percentuais de Lula. O fator inercial tende a favorecê-lo.

Se o presidente e sua campanha não conseguirem criar um fato que interrompa essa tendência, a probabilidade maior é o tucano chegar a um empate técnico nos próximos dias. Daí a ultrapassar o presidente será um passo. Esse fato pode ser um bom desempenho no debate, uma solução rápida para o dossiêgate, uma estratégia de campanha de impacto.

Até agora, Lula estava numa posição olímpica. Cantou vitória, errou ao fugir do debate da quinta-feira passada na Rede Globo. Terá de descer do pedestal e entrar no ringue, o que não significa jogo baixo. Como ninguém perdeu dinheiro subestimando a inteligência do PT, é lícito supor que alguns setores do partido e do governo possam se sentir tentados a criar um fato "Tabajara" para tentar reverter a óbvia tendência favorável a Alckmin.

Teoria - O texto acima tenta fazer uma análise baseada nos dados das pesquisas. Mas, no "day after" do primeiro turno, circulam muitas teorias para explicar os desempenhos de Lula e Alckmin e antever o desfecho da segunda rodada. Uma delas seria que parte do eleitorado votou para forçar Lula a se submeter a um segundo turno. Feito isso, migraria para o petista. É uma teoria. Os próximos dias vão deixar mais claro o cenário futuro. Por ora, melhor ficar com os "dados científicos".